domingo, 24 de janeiro de 2021

sábado, 23 de janeiro de 2021

AMAZONIZAR ALTAMIRA: DECOLONIALIDADE E RETERRITORIALIDADE

 

Universidade Federal do Oeste do Pará

Pró-reitoria de pesquisa, Pós-graduação e Inovação Tecnológica

Instituto de Ciências da Educação

Programa de Pós-graduação em Educação

Decolonialismo e formação nos contextos da cibercultura

 

 

AMAZONIZAR ALTAMIRA: DECOLONIALIDADE E RETERRITORIALIDADE

PRATES, José Roberto Rodrigues

 

RESUMO

Num breve período pandêmico, o mundo sofre mudanças em diversificados setores do conhecimento, e a ciência tem dificuldade de explicar que num curto espaço de poucos meses a educação formal e os métodos pedagógicos, e não somente na educação, mas na saúde, nas artes e nos sistemas de produção, entre outros setores das atividades/ações da humanidade, a influência das tecnologias da informação e a cibercultura, tanto em hardwere como em softwere tenha influência tão fundamental. Não que a Educação à distância – EAD ou também a denominada educação remota, seja um fato novo, mas a quarentena, o distanciamento social e a exigência de evitar aglomerações e proximidade nos relacionamentos sociais, exigiu da tecnologia da informação, da comunicação pelas redes sociais e pelas live, tanto para aulas teóricas e práticas, reuniões de trabalho, reuniões de militância, eventos educativos, artísticos, seminários, simpósios, congressos, espetáculos de música, teatro, saraus de poesia e até mesmo sessões de plenários legislativos, comícios eleitorais, etc, se obrigaram a serem realizados através de plataformas eletrônicas, as mais diversas, umas mais, outras menos interativas, entretanto, nada parou, ao contrário, parece que tudo se adiantou, sem contato presencial, no entanto numa efervescência de ocorrências, tudo ao mesmo tempo agora. E ainda com a vantagem da opção da possibilidade da gravação do evento para posterior visualização.

Neste sentido, de forma extraordinária, utilizando técnicas remotas e presenciais este projeto consiste de uma intervenção social pública para produzir ideias insumos para elaboração de um ensaio de planejamento da Agenda 2030 da ONU, (http://www.agenda2030.com.br/), através dos 17 temas dos ODS – Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, almejando conduzir o território de Altamira a se tornar um lugar de bem viver, uma sociedade do bem estar, a “terra sem males”, sonho dos povos originários, que continuam sonhos nossos, na atualidade.

Desta forma pensando no projeto 50 + 50, considerando o planejamento dos próximos 50 anos, cremos que tanto a educação como outros políticas transversais devem considerar a agenda 2030, planejando os 17 temas transversais, particularmente o item 17 relativo às parcerias e meios para implementação dos outros 16 itens da plataforma.

 

 

 

Justificativa

O processo de decolonialidade coincidindo com a reterritorialidade em Altamira, como referência para outras localidades amazônicas ou de outros biomas, devem ter a educação, a literatura e a cibercultura como ferramentas de transformação, de luta, de conquistas de espaço geográfico em disputa.

Assim pela decolonialidade e reterritorialidade, deve-se concentrar esforços na política cultural, educação por todas as modalidades que a pedagogia oferece, arteeducação, educomunicação, tecnologia de informação, e o conhecimento das diversificadas paisagens materiais e imateriais do território, através da história dos processos de apropriação do poder no território desde tempos imemoriais dos povos originários, populações tradicionais até os recentes processos de imigração e de desterritorialização provocados pelos grandes projetos econômicos e outros processos de colonização movidos por interesses capitalistas, ou interesses governamentais com desconsideração da justiça social e ambiental por este pedaço da Amazônia. Estudando Milton Santos, Miguel Arroyo, Anibal Quijano, Pierre Levy, André Lemos, Boaventura Souza Santos, Deni Alfaro Rubbo, bem como autores locais como Antonio Herrera, José Neto, Ana Paula Santos, Carla Rocha, Leonardo Zenha, Raquel Lopes, Raimunda Monteiro, Anderson Serra, José Neto, Ivonete Coutinho, Francivaldo Mendes, Eliza Estronioli e outros autores que têm pesquisado e apresentado dados consistentes da realidade cultural, social, econômica, ambiental e política do território de Altamira e da sua relação de interdependência com a Região do Xingu, bem como da integração das políticas públicas em nível local como reflexo do global, para possibilitar pensar uma paisagem sustentável para as próximas décadas, com profundo e absoluto respeito aos direitos humanos e à ecologia integral, a partir dos temas da Agenda 2030 da ONU, considerando que será por dentro da organização política mundial envolvida com a colonialidade que poder-se-á eliminar as amarras da dominação, promover a decolonialidade e produzir novas paisagens da reterritorialidade com sustentabilidade, liberdade, qualidade de vida e justiça socioambiental. Um sonho justificável e realizável, não apenas utopia.

 

 

Objetivos

Geral:

No longo prazo, conquistar a sociedade do bem viver, a terra sem males, anseio dos ancestrais, num processo de desconstrução da violência social e doméstica que estamos denominando de Amazonizar Altamira, como referência ou exemplo demonstrativo para outras localidades.

 

Específicos:

1 - Planejar um a um os 17 temas da Agenda 2030 da plataforma dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU - (http://www.agenda2030.com.br/);

2 - Enfatizar a relação de transversalidade de cada um dos temas ao ser visto cada um individualmente;

3 - Agrupar as afinidades temáticas, para facilitar a produção de resultados no processo de planejamento considerando as transversalidades;

4 - Sistematizar um Plano de Ação executável a partir de mobilização social;

5 - Implantar uma campanha de publicidade para dar visibilidade ao plano e mobilizar público para sua execução.  

6 - Assegurar sustentabilidade aos meios, modos e sistemas de produção e consumo, respeitando as diferenças. contemplando a diversidade cultural dos grupos populacionais do território.

7 - Contemplar a participação de todos os segmentos étnico raciais, sem discriminação de gênero, raça, credo, origem, orientação sexual ou outras diferenças da diversidade cultural.

 

Metas

Tornar nossas armas mais poderosas que as armas do inimigo, nossa arma é nossa voz nossa munição é nossa palavra, por nossa voz consideremos as redes sociais, os programas de rádio, o poema, o texto, o ensaio literário, o texto de teatro, e outros elementos de linguagem que emitam opiniões sobre a contracultura, usar a tecnologia da informação, para dizer a verdade, de forma lúdica, atraente e convincente.  

Concorrer com este texto do planejamento de Altamira para os próximos 50 anos através da Agenda 2030, ao prêmio de literatura do Festival Cultural 50 + 50, programado para 2022, quando completará 50 anos da inauguração da BR 230 – Rodovia Cel. Mário Andreaza, mais conhecida com Transamazônica, em 1972. O Festival Cultural 50 + 50, objetiva celebrar o cinquentenário da BR 230 e pensar o planejamento dos próximos 50 anos, por isso buscando adiantar tal processo pensamos em trabalhar esta meta do Festival, lançando durante o evento e concorrendo a um dos seus prêmios, uma publicação apresentando uma das suas metas. Um tanto ambicioso, mas a bem do coletivo, Altamira como território existencial pode ambicionar pela sua espiritualidade transcendental, se reterritorializar através de um processo de decolonialidade.

 

Metodologia/operacionalização

1 – Constituir parcerias para dar suporte executivo, técnico e político ao projeto na realização das atividades/ações da intervenção social.

2 – Programar e realizar uma jornada de rodas de conversa com o tema “Amazonizar Altamira: processo de decolonialidade e reterritorialidade”, em 07 (sete) escolas, da UFPA (Faculdade de Educação, Faculdade de Geografia e Faculdade de Etnodiversidade), UEPA, IFPA, e Escolas Estaduais de Ensino Médio (Polivalente e Dairce Pedroza), e dos debates e discussões nas rodas de conversa, extrair/colher informações, ideias, sugestões, subsídios, naturalmente dando o crédito aos seus autores, para enriquecer as reflexões e propostas do planejamento da Agenda 2030 de ONU, sobre cada um dos 17 ODS – Objetivo de Desenvolvimento Sustentável. Vale ressaltar que tais rodas de conversas, apesar de abertas ao público e com ampla divulgação, não almeja grande quantidade de participantes, mas sim qualidade dos participantes em oportunizar argumentos e proposições sobre os temas em discussão.

3 – Realizar uma live com tema, em uma rede social, apresentando o assunto e solicitando contribuições dos participantes com tal debate para oferecer subsídios e enriquecer a discussão sobre os temas, considerando a transversalidade entre os mesmos.

4 - Coletar todos os argumentos apresentados nos eventos tanto virtual como presencial.

5 - Viabilizar financiamento para as atividades que demandarão custos para realizar.

6 – Sistematizar, buscar relacionar autores com os temas em discussão, diagramar e editar uma publicação observando tanto quanto possível, as normas da ABNT para publicação científica, embora o exercício/experiência tenha mais interesse prático e político que teórico e acadêmico.

7 – Viabilizar a impressão da primeira edição com no mínimo 1.000 exemplares.

 

Cronograma

Em virtude desta Pandemia da Covid 19, que  mesmo que ocorra a vacinação massiva em breve, não dará segurança para realização de atividades que envolvam aglomeração, num curto prazo, como as rodas de conversa, portanto estas somente ocorrerão num segundo momento, as primeiras etapas consistirão da pesquisa e estudo sobre aspectos geográficos, históricos e culturais do território, bem como dos temas da agenda 2030 da ONU, que não envolvem público presencial, que serão apresentadas na live, a ser amplamente divulgada no facebook, instagram e whatsapp e acreditamos poderá mobilizar um número significativo de ciberativistas, que também oferecerá subsídios para as rodas de conversa posteriores.

Estamos pensando com bastante flexibilidade, em virtude que os primeiros resultados da agenda 2030, ainda dispõe de 9 anos para ser concluída, claro que quanto antes for adiantada melhor, para isso pensamos em nestes 18 meses para o evento 50 + 50, que deverá ocorrer no segundo semestre de 2022, quando devemos ter a 1ª edição da publicação com o conteúdo inicial do plano da plataforma dos ODS da ONU, temos portanto 6 trimestres para elaborar sua primeira versão impressa e em condições de apresentação no Evento 50 + 50.

Assim pensamos no seguinte cronograma:

Fevereiro a abril de 2021 - encaminhamento projeto de captação de recursos

Março a junho de 2021 – constituição e formação de parceria institucional para realização de ações da intervenção e inicio de levantamento bibliográfico dos autores citados para estudo da situação cultural, histórica, geográfica, ambiental e econômica de Altamira relacionando com autores externos e a interdependência do local com o global.

Maio a julho de 2021– inicio da mobilização virtual pelas redes sociais, que permanecerão por tempo indeterminado, pelos próximos anos, até após a conclusão deste projeto, que deverá ter continuidade pelos próximos anos e décadas.

Julho a novembro de 2021 – ações presenciais nas universidades e escolas de ensino médio, bem como nas comunidades, por se tratar de intervenção social, espera-se que extrapole as instituições escolares, por se tratar de interesse das comunidades.

Dezembro 2021 a março de 2022 – sistematização das discussões pelas redes sociais e presenciais e elaboração de novo cronograma de reuniões de rediscussão temática para formatação do plano de cada tema da plataforma ODS.

Abril a junho de 2022 – Edição de textos, revisão e providências para publicação. 

 

CONTEÚDOS

 A agenda 2030 da ONU, oriunda dos objetivos do milênio, em 2015, definiu os temas como seguem, no caso de Altamira, devemos ver caso a caso, considerando a situação específica deste território e a intersetorialidade destes temas com as políticas implementadas nesta localidade tanto pelo poder público local, como pela sociedade, assim,  devemos considerar o agir local pensando no global.

Como a cultura e as artes devem ter um papel preponderante na discussão, bem como devemos articular atividades de música, dança, teatro outras ações lúdicas como ferramentas pedagógicas, alguns poemas que já apresentamos neste trabalho, como “Arma de guerra”, “Já dizia Miguel Arroyo: Por favor Pedagogia”, “Amazonizar o Mundo” e “A Carta da Terra em resumo”, já oferece alguns conteúdos a serem debatidos, relativo ao tema.

 

 

Arma de guerra

 

Educações em rede

É arma de guerra

Contra o coronavírus covid 19

Aspergindo informações

A todo o povo da terra.

 

 

Educações em rede

É arma de guerra

Contra a ignorância estúpida

Contaminando de saber saúde

A todo povo da terra.

 

 

Educações em rede

É arma de guerra

Contra o racismo estrutural

A eliminar a filtragem etno-racial

A todo povo da terra.

 

 

Educações em rede

É arma de guerra

Contra capitalistas insanos

Orientando justiça econômica

A todo povo da terra.

 

 

Educações em rede

É arma de guerra

Contra governos injustos

Ensinando o bem viver

A todo povo da terra.

 

 

Educações em rede

É arma de guerra

Contra não civilizados

Conduzindo à terra sem males

Todo o povo da terra.

 

Zehrob Prates / abril de 2020

 

Conceituei em 2004, por minha conta e risco, o verbo Amazonizar, como sendo a ação de entender a relação humanidade X natureza, considerando a preponderância da Amazônia com sua territorialidade vocacionada pela natureza, águas, florestas, solos, biodiversidade e demografia tanto de populações originárias como outras populações tradicionais e de imigrantes. Amazonizar é portanto assumir a responsabilidade e a defesa da justiça socioambiental.

AMAZONIZAR O MUNDO

Amazonizar o mundo é se sensibilizar
Reordenar o território, as “cuencas” unificar
Indígenas, quilombolas, populações tradicionais
Recursos Naturais, Recursos Culturais
Biosfera, Biodiversidade, Conhecimentos... Socializar
Humanos somos parte da Teia da Vida
Predadores integrantes da Cadeia Alimentar

Igarapés, Rios, Terras, Florestas, Bichos,
Povo... Humanizar é Harmonizar
Construção do futuro ou destruição?
Temos ou não temos que optar?
Planejar processos de informar... Comunicar
Agendas 21 profetizar

Pan Amazônia Cooperar
Cada bacia individualizar
Local e global, pensar e atuar
Para um novo tempo de libertação almejar
Conflito é PACIFICAR

Pensar conservar, pensar preservar
Novas gerações da gaia vai precisar
Da terra não poderemos mudar
Usar recursos da natureza?
Temos ou não temos que pagar?
A quem é permitido negociar?
Águas, terras, madeiras, sementes, gente
Direitos de tod@s assegurar
Sociedades livres comunidades saudáveis
Elevado IDH... Tod@s vivenciar
Justiça socioambiental podemos conquistar
Cidadania capacitar
Novas tecnologias adequar na produção que
praticar

Urbanidades reterritorializar e sanear
Coalizões em Rede exercitar
Em vez de a Amazônia globalizar
O mundo todo AMAZONIZAR.

                                                                                          Zehrob Prates / 2004

 

ALTAMIRA COMO TERRITÓRIO EXISTENCIAL

 


Na floresta ou na hiléia sombria. Tudo é forte, viçoso e gigante
Altamira onde o sol oficia. Revestida de luz deslumbrante.
Oh! Terra amada e fecunda. Fecundo e ditoso chão
Luz do céu teu seio inunda. Oh! Terra da promissão.
Do Xingu águas verdes parece, verde tela de verde polida.
Altamira de verde se tece, terra linda de verde vestida.

(trecho Hino de Altamira, Jonatas Batista, 1911)


          Pressuposto básico num processo de planejamento de projeto em um território, é dispor de um mínimo de conhecimento sobre a formação histórico-geográfica de tal território, tanto nos aspectos físicos e materiais como imateriais, notadamente quando se relaciona à espiritualidade da população na sua relação com os fatos existenciais locais, assim:

...Os modos de vida e os sentidos vinculados à constituição de um território existencial são reduzidos a espaços físicos e respostas motoras que se relacionam. A qualidade e a multiplicidade cedem lugar à unidade e à generalidade (Alvarez e Passos, 2009, p. 133).

 

A cidade de Altamira, tem mais de um século de emancipação administrativa e política e com uma riqueza de recursos naturais e culturais de elevado potencial e no entanto vive a maioria da sua população com muito baixo índice de renda per capta, pouco mais de quatrocentos reais por mês por habitante, (https://cidades.ibge. gov.br/brasil/pa/altamira/panorama). Como já afirmaram variados autores sobre a economia da Amazônia, com textos semelhantes, mesmo que em diferentes enfoques, dando a entender que: convive a população na pobreza em meio a uma enorme riqueza (Rolim, 2015); (Marques, 2019). Além deles, referindo-se ao mesmo assunto:

Constata-se, assim, que em sintonia com a lógica de exploração dos recursos das regiões ricas em natureza, como é o caso do estado do Pará, os indicadores econômicos e os indicadores sociais apresentam movimentos simultâneos em sentidos opostos: os primeiros avançam, enquanto os últimos recuam. Embora o estado do Pará ocupe lugar de destaque na economia regional, como maior PIB da Amazônia Legal (25%), a este considerável crescimento econômico – em função da exploração mineral - corresponde, um desenvolvimento social compatível com ele, no sentido oposto. Isso se explica não só pela ação das empresas multinacionais, como também, e complementarmente, pela ação dos estados, subordinados ao grande capital, seja ele nacional ou internacional. (Nascimento, 2009)

 

Altamira, iniciou seu processo de colonização a partir da chegada dos Jesuítas no início do século XVIII. Até estes serem expulsos do Brasil no fim daquele século, foram os primeiros brancos a habitarem este lugar, espaço percebido e vivido (Souza, 2013), ao qual denominaram Missão Tavaquara e posteriormente povoado Tavaquara, até 1883, quando o Coronel Gaiozo, que viajava com frequência para a Europa e descobrindo na Espanha um lugar denominado Cavernas de Altamira, com inscrições rupestres semelhantes às que haviam nas suas terras nas margens do rio Xingu, resolveu mudar a denominação desta localidade quando esta foi elevada de povoado a Vila, como distrito de Souzel, em 2 de abril de 1883, recebendo o nome de Vila de Altamira. Período em que barcos a vapor transportavam as chamadas ervas do sertão e que chegavam até o porto de Vitoria, pelo igarapé Tucuruí, hoje cidade de Vitória do Xingu, (Araujo, 2012).

No livro “A Batalha do Riozinho do Anfrísio: uma história de índios, seringueiros e outros brasileiros”, obra literária impar e fundamental para se entender os primórdios da cidade de Altamira e compreender certas contradições no processo de colonização, por consistir de história baseada em fatos reais, a saga da família do pai do autor, o seringalista Anfrísio Nunes, recheado de aventuras envolvendo importantes personagens reais do ciclo da borracha (Nunes, 2003), permite pensar a vastidão de Altamira como um território existencial.

Considerando o conceito de território, como um espaço geográfico em disputa pelo poder político e econômico, com dinâmica própria e cultura em processo contínuo de transformação (Souza, 2013), podendo atingir a desterritorialização, que consiste de mudança das relações de poder político, com drásticos impactos socioeconômicos, ambientais e culturais, onde a disputa passa a ocorrer pela reterritorialização, (Herrera e Santana, 2013), quando os derrotados na disputa pelo poder no território, continuam mantendo resistência, entendendo reterritorialização como sendo a recuperação ou retomada do território por seus antigos detentores, (Souza, 2013).

Altamira passou ao longo da sua história por diversos ciclos econômicos, todos potencialmente geradores de renda: ciclo da borracha (Nunes, 2003), ciclo do ouro, que teve tempos áureos entre 1950 e 1970, quando a Vila da Ressaca, chegou a centralizar os garimpos do Galo, Itatá, Grota Seca, Morro das Araras, Ouro Verde e Curimã (Moriyama, 2013), entrando em decadência pouco antes da inauguração da rodovia Transamazônica – BR 230, em 1972, dando início ao ciclo da agropecuária.

A partir de 1972, o INCRA – Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, implantou o PIC Altamira – Projeto Integrado de Colonização, quando foram distribuídos sob os slogans da ditadura militar “Terra sem homens para homens sem terra” e “Integrar para não entregar”, distribuiu ao longo da rodovia Transamazônica, em área que posteriormente se tornariam municípios, lotes de terras, parcelas de grandes glebas, para imigrantes vindos de diversos estados de todas as regiões do Brasil, que se aventuraram a participar deste processo de colonização, vindo a receber dezenas de milhares de famílias, dando forte impulso à economia regional, período este em que conviveu a agricultura familiar com o agronegócio e a exploração ilegal de madeira. Enquanto muitos agricultores familiares focavam suas atividades na produção de grãos e lavoura temporária e alguns experimentos com lavouras permanentes, vindo posteriormente fortalecer a lavoura do cacau, ainda hoje com relevante importância econômica, outros se dedicaram à pecuária extensiva.

Durante todo este período, a cidade de Altamira se comportou como polo regional, ou capital da Transamazônica, absorvendo e comercializando, inclusive se beneficiando da arrecadação tributária das produções agropecuárias dos municípios vizinhos, que se implantaram entre 1989 e 1997, como Anapu, Brasil Novo, Medicilândia, Uruará e Vitória do Xingu, (Araujo, 2012).

Parte deste ciclo da Agropecuária conviveu com a exploração madeireira, que foi por longos anos a principal atividade econômica de Altamira, vindo a entrar em decadência no início do século XXI, pelo elevado grau de ilegalidade, somada ao caráter predatório da exploração, provocando eliminação de milhares de empregos e grave crise econômica como consequência do fechamento de dezenas de serrarias.

A partir de 2010, a Licença de Implantação da UHE Belo Monte, modifica mais uma vez o ciclo econômico da região, quando Altamira se torna província energética, reestruturando a cidade de forma violenta, por uma drástica mudança nas relações de poder na localidade, num clássico processo de desterritorialização, vindo a Norte Energia S.A, receber por Leilão Público Federal, a concessão para o aproveitamento das águas do rio Xingu para geração de energia elétrica, praticamente se tornando a gestora regional das políticas públicas, pelo menos no auge dos investimentos ocorridos entre 2011 e 2017, considerando que dirigentes das prefeituras e os gerentes dos órgãos estaduais, inclusive de saúde, educação, saneamento básico, assistência social, entre outras, praticamente se tornaram subordinados da Norte Energia como empreendedora da UHE, em virtude dos elevados valores de recursos financeiros desta empresa destinados como condicionantes para custeios e investimentos em compensação, mitigação e reparação de impactos socioeconômicos e ambientais, que em teoria deveriam ser investidos de forma participativa com gestores locais e a sociedade civil, que infelizmente não ocorreu.

O que Altamira conquistou, certamente são incertezas sobre o futuro, uma vez que os impactos ambientais e sociais ainda não foram devidamente mensurados, a desordem econômica com o final das obras estão ainda sendo avaliados. O que mais se sente e tem sido reclamado pela sociedade é a falta de segurança pública, devido Altamira ter se tornado a cidade mais violenta da Amazônia e das mais violentas do País, considerando o número de assassinatos por 100 mil habitantes.

Ainda, o impacto na vazão hidrológica da Volta Grande do Xingu, também é um grande risco, ainda não devidamente avaliado, em virtude do secamento de um trecho de aproximadamente 100 km de parte do rio, pela barragem de derivação, conceito técnico para desvio das águas de um rio, transpondo as águas do seu curso original para enchimento do canal artificial, que as levam para a casa de força principal da UHE Belo Monte.

Ribeirinhos, pescadores, indígenas e moradores das margens da Volta Grande do Xingu, têm reclamado dos impactos ambientais motivados pela redução da vazão do Xingu neste chamado TVR – Trecho de Vazão Reduzida, particularmente para a ictiofauna, sentida fortemente na pesca artesanal por indígenas e populações tradicionais da área que têm no pescado uma das principais fontes de proteína. O que pode se agravar com o tempo, em virtude do pouco tempo do barramento no TVR. O que a Norte Energia está chamando de “Hidrograma de Consenso”, referindo-se à descarga das águas com seu material de suspensão após a barragem, parte dessas águas turbinadas, por terem passado por máquinas de geração de energia, através de uma fórmula matemática extremamente técnica, de complexas variáveis, para um controle da vazão por comportas na barragem do TVR, ainda não suficientemente explicada, muito menos entendida, tanto por hidrólogos como pelos diretamente impactados, os moradores das margens do rio nesta área, que tem sido denominada por setores da resistência como “Hidrograma de Conflito” em vez de Hidrograma de Consenso.

Os impactos da província energética estão sendo sentidos de forma muito drástica pelas diversas etnias indígenas da região, face à desestruturação cultural étnica ou culturicídio, considerado por antropólogos de renome como (Castro, 2016) e (Cunha, 2019) como etnocídio, (UFPA ATM; ISA; XINGU VIVO, 2019), uma ameaça concreta de extinção de povos originários do território de Altamira.

Considerando Altamira como território existencial, a desigual e injusta distribuição de renda, leva a rever o conceito de “desenvolvimento” considerando este como sendo um processo em que os investimentos nos sistemas de produção, priorizando grandes obras, mineração e o agronegócio, nos moldes capitalistas (Nascimento, 2009), beneficiando poucos em detrimento de muitos, defendendo como política de produção de progresso social, desprezar o desenvolvimento e propor o inverso, o “envolvimento” produtivo, capaz de realmente produzir o “bem estar” e o “bem viver” (Comitê Rio +20 Cúpula dos Povos, 2012), do quê a diversidade das populações de Altamira tanto necessitam e são merecedoras.

 

PEDAGOGIA PARA ENTENDER A REALIDADE

Entretanto infelizmente, a realidade não aparece com ela realmente é, ela aparece com uma aparência que cada um observa à sua maneira, uns com aparência mais próxima da realidade outros com aparência mais distante da realidade, mas é preciso considerar que nenhum imagina a aparência exatamente real, tudo é relativo sendo portanto necessário relativizar os fatos, fenômenos, ocorrências, situações, conforme sua própria interpretação da aparência.

 Assim, a cidade de Altamira, que passou ao longo da história por diversificados processos colonizatórios, com registros a partir de meados dos século XVIII, quando os primeiros aventureiros pelas águas do rio Xingu se propuseram interagir com os povos originários que nesta região perambulavam. Sim perambulavam porque os povos originários eram nômades, viviam se deslocando pelos rios e pelas florestas entre um curso d’água e outro. Mas a rede hidrográfica, sempre foi o marco divisório nesta região da Amazônia.

Amazonizar Altamira na atualidade é mais que necessário. Crianças que aqui nasceram, imigrantes que para aqui se deslocaram, não enxergam a Amazonia em Altamira, enxergam uma cidade de concreto, com ruas pavimentadas de asfalto e cimento, algumas de barro e esburacadas é verdade, mas uma cidade como outras de qualquer lugar do Brasil, e não relacionam a cidade de Altamira com a natureza da Amazônia, sua vocação natural, um ambiente de natureza exuberante, florestas de terra firme, vegetação abundante, elevado potencial de biodiversidade. Exigindo assim a conjugação do verbo Amazonizar: eu amazonizo, tu amazonizas, ele/ela amazoniza, nós amazonizamos, vós amazonizeis, eles/elas amazonizam. Portanto, como exorta o papa Francisco no “Querida Amazônia”, um desdobramento da Encíclica “Laudato Si”: AMAZONIZA-TE, AMAZONIZA-TE, AMAZONIZA-TE! Largamente divulgada pela REPAM – Rede Eclesial Pan Amazônica. Assim, como Altamirense comprometido com o futuro da humanidade, e entendendo, ou “profetizando” que se não houver cuidados com compromissos urgentes com a mudança de comportamento do “homo nem tanto sapiens” com a redução da desigualdade e injustiça sociai, sustentabilidade dos sistemas de produção e consumo, tanto no agroextrativismo como na indústria, defesa das florestas, da vida aquática e vida terrestre, defesa de toda biodiversidade, defesa do equilíbrio do clima, combate ao racismo e à filtragem etno racial, combate à desigualdade de gênero, defesa da saúde e bem estar, educação de qualidade, Água potável e saneamento, cidade e comunidades sustentáveis e confortáveis, energia limpa e parceria e união da sociedade civil e governos para implementação destas políticas, que estamos denominando de AMAZONIZAR ALTAMIRA, no caso desta localidade, para servir de exemplo a outras localidades, considerando o agir local pensando no global.

Assim, consideramos que estaríamos aplicando um processo de decolonialidade para o bem viver.

Considerar a literatura poética engajada e os saraus como elementos da educação tanto remota como presencial, como demanda Miguel Arroyo: por favor, aproximemos a arte da pedagogia.

Considerar também na atualidade a relação da cibercultura com a dominação política nos processos de colonização.

JÁ DIZIA MIGUEL ARROYO: POR FAVOR PEDAGOGIA

José Roberto Prates *

Não é apenas na escola que se estuda, que se aprende

Por favor, a pedagogia não está apenas na escola

Não se aprende a ser “sujeito”

Ser “sujeito” é uma conquista

A tarefa da pedagogia é fomentar processos

Por favor, não reprovar, contribuir para aprovar

Por favor, pedagogia, por favor

Entender a pedagogia como arte de educar humano

Entender o humano como sujeito de direitos!

Por favor, isso é fundamental, por favor!

Por que deixar “Vidas ameaçadas”?

O Estado bate palmas para o assassinato de jovens negros...

Jovens negros não nasceram assassinos

Mães negras choram seus filhos mortos

Não nascemos prontos, nos tornamos humanos

As mulheres não nascem mulheres se tornam mulheres

Não somos sujeitos bio, somo sujeitos cultura

Nossa primeira pedagoga é nossa mãe

É preciso estudar a pedagogia materna

É preciso estudar a pedagogia do amor

Por favor, precisamos aprender com essa mulher, essa mãe educadora

Por favor! Quando os sujeitos são outros,

A pedagogia precisa ser outra!

A pedagogia precisa entender

a realidade teórica dos movimentos sociais

A pedagogia precisa respeitar

Outra concepção de mundo, Sujeitos e Relações sociais 

A síntese do povo é a mulher!

Por favor, respeitem as mulheres!

Sabemos de onde viemos? Quanto custou chegar até aqui?

Somos outros! Somos sujeitos humanos!

Diferentes uns dos outros

Como já dito: quando os sujeitos são outros

A pedagogia precisa ser outra!

Somos sujeitos coletivos, classes sociais! Por favor

Exercitemos a pedagogia do oprimido

A opressão existe, insiste, persiste

Como sujeitos devemos insistir, não desistir

Exercitemos a pedagogia da indignação

Contra a brutalidade da realidade social

Os movimentos sociais conscientes crescem

Mas a violência do capital é desproporcional

O que fazer então???

Escola integral integrada de pedagogia social

Para vencer a violência irracional

Negro drama, cabelo crespo, pele escura

Vestindo preto por dentro e por fora

Esses nativos não são humanos? Não são gente?

Não sou eu que me navego, quem me navega é o mar

Qual é o meu ofício pedagogia?

Por favor, qual é o meu ofício?

Responsabilidade pedagógica

A educação não salva a humanidade,

mas a ajuda a ser menos injusta

por favor, para radicalizar a política

devemos radicalizar a pedagogia

radicalizar a educação

Lutar por terra, por teto, por direitos, ocupar os espaços

Educação popular cultura de libertação

Arte na educação, arte na pedagogia, arte na revolução

Literatura, poesia, música, dança, desenho e pintura

São ferramentas pedagógicas

A Guernica de Pablo Picasso contra a guerra na Espanha

Por favor pedagogia, nos aproximemos da arte

Trabalho infância – Tem espaço na agenda pedagógica?

Oficio de mestre – Qual o papel do professor?

Imagens quebradas – trajetórias e tempos de alunos e mestres

Outros sujeitos outras pedagogias

Passageiros da Noite: do trabalho para a EJA - itinerários da vida justa?

Território em Disputa

Contra o culturicídio brutal em nome da coroa, do rei ou da república

Por favor Pedagogia

Desobediência civil e transgressão estão na ordem do dia

Inversão pedagógica para mudar o rumo da história

Em vez da destruição, construir um futuro sustentável é sua missão.

 

Altamira, julho de 2019

* Aluno do curso de especialização - Educação por inversão pedagógica: Inclusão para emancipação em territórios socioeducativos da Transamazônica e Xingu - Faculdade Etnodiversidade – UFPA Campus Altamira

Poema baseado em sistematização das Conferências proferidas pelo Prof. da UFMG Dr. Miguel Arroyo, Durante a II Jornada da Etnodiversidade, de 1 a 5 de julho de 2019 em Altamira - PA.

 

Carta da Terra em resumo - Zehrob Prates / 2003

Terra nosso lar

Comunidade de Vida Global

Desafios para o Futuro

Compromisso Universal

Respeitar a Terra e a
Vida em toda diversidade
Dignidade para todos
O potencial intelectual,
Artístico, ético e espiritual
Na humanidade dar e receber
Compreensão, Amor,

SER e não TER!

O Bem Comum,
Sociedades Democráticas
Justiça, Participação,
Solidariedade e Paz
Subsistência Segura
É garantia de acesso
À todas as necessidades
das atuais e gerações futura

Saúde Ambiental, Bioética
Respeito às minorias,
Tolerância é sabedoria
Desconstrução da violência
Espiritualidade da vida
Todos os seres da GAIA

Estados e nações cooperando-se

Territórios Sustentáveis

Reordenamento do desenvolvimento
E transparência nas políticas públicas
Controle social da gestão sociambiental

Ética e governança Global
Democracia e ordem gerencial

Gestão do conhecimento,
educação, ecoalfabetização
Comunicação e Sensibilização
Desafios econológicos com moral
A espiritualidade de cada lugar
É uma parte importante do global
Punir a improbidade humana
Tem Jeito Sim – Agenda 21!!!

Seres vivos impedir a extinção
Recursos Naturais impedir a exaustão

Biodiversidade, justa repartição

Termos de Ajustamento de Conduta?

TAC para tod@s, pessoas físicas
e Jurídicas naturalmente
Pessoal e institucional,
Governamental Principalmente

Oportunidades em capacitação
Empoderamento na atuação
Todas as idades, educação
Arte, Ciência, inovação
Gestão de conflito, manejo,
Restauração e conservação
Ecologia, Tecnologia de gestão
Diversidade de culturas é vida
Mesmos direitos e deveres
Mudança na mente e no coração
Metas de curto e longo prazos
Indivíduo, família e organização
Religiões, escolas e comunicação
Liderança criativa em ação
Parceria socioambiental é a orientação
Soluciona o conflito com negociação.

Reverência face a vida
Sustentabilidade alcançar
Alegria e Paz, vida a celebrar.

Considerações finais

Não temos a certeza do que será realizado do exposto, vai depender do apoio e das parcerias nas discussões dos problemas e busca de soluções, aparentemente algo relativamente grande que nos faz sentirmos muito pequenos diante do desafio, entretanto em maior ou menor grau, nem que seja apenas uma publicação com exposição do plano das políticas setoriais e transversais de cada tema da agenda da ONU será realizada, produzida, editada e publicada como ferramenta pedagógica, a ser utilizada em processos educativos na formação continuada da juventude tanto na educação formal, como no cotidiano das comunidades, considerando a interface dos temas apresentados com a vivência das populações do território de Altamira, tanto na cidade como nas áreas ribeirinhas e rurais.

Tal publicação poderá também ser utilizada no planejamento de políticas públicas setoriais para os orçamentos públicos do governo municipal para a gestão do território.

Serão propostas avaliações anuais, trianuais, quinquenais e decenais, conforme a complexidade das variáveis envolvidas na dinâmica temporal dos temas planejados.

 

Altamira (PA), 20 de janeiro de 2021

José Roberto Prates